A 4ª Edição do Cabíria Festival Audiovisual acontece de 27 de julho a 03 de agosto. Sob o tema “Feiticismo”, oferece uma gama de obras para conectar cineastas e públicos de diferentes gerações. Criado em 2019, o Festival é dedicado à promoção de conteúdos criados por mulheres e busca agregar expressões e identidades de gênero diversas e comunidades LGBTQIAPN+. O projeto é uma ampliação do Cabíria Prêmio de Roteiro, que desde 2015 valoriza a autoria de roteiristas mulheres e histórias com protagonismo feminino na diversidade de sua expressão.
Entre o Fetiche e o Feitiço
Feiticismo é a palavra-conceito que norteia a curadoria da 4ª edição do Cabíria Festival Audiovisual, que tem como tema “Entre o Fetiche e o Feitiço”.
Os filmes presentes na programação desta edição suscitam reflexões sobre quem os produz e quais são os significados de seus corpos na dinâmica do capitalismo. Apresentam relações sociais, afetos, sonhos, condições e subjetividades de mulheres diversas e suas distintas e promissoras inadequações ao sistema.
Além disso, deixam sobressair na tela as tessituras ficcionais, as fabulações, os misticismos e as desnaturalizações na produção de narrativas audiovisuais e nas formas de representar mulheres em suas pluralidades e transcendências. Num ano em que há tanto em jogo, projetar futuros melhores – e feministas! – é indispensável.
Como método de concepção curatorial a partir dessas impressões, “canabalizamos” a conceituação marxista de “fetiche da mercadoria”: uma energia fantasmagórica e extraordinária que dá significado ao valor das mercadorias no sistema capitalista e substitui, de forma ilusória, a percepção das relações sociais e de trabalho intrínsecas em suas construções e existências.
Já a ideia de “feiticismo” é aqui apreendida por ser a base etimológica do termo “fetichismo” e por estar relacionada a uma espécie de feitiço que seria emanado pelos objetos de adoração humana animados por meio do mistério, do fantástico, do mágico, do onírico. Além disso, consideramos o “fetichismo” a partir da apropriação feita pela psicanálise, que o vincula à projeção de desejos sexuais a princípio impróprios.
Outras análises desencadeadas pelos filmes da programação que nos fizeram chegar ao tema e suas conceituações merecem destaque: as construções fílmicas que dão relevo ao trabalho de cineastas e personagens como forma de existência e resistência; a explicitação, nas imagens das obras, de nossas naturalizadas relações desejantes e alienantes frente aos objetos de consumo e os desejos narrativos de que os corpos de mulheres não sejam fetichizados nem vistos e tratados como mercadorias.
Entre o Fetiche e o Feitiço, a personagem Paula projeta numa piscina a concretização de seus anseios por mudanças em “A Felicidade das Coisas” (Thais Fujinaga, 2021). No longa-metragem, a piscina detém a força fantasmagórica que a faz ser desejada, seja sócio-economicamente, seja emocionalmente, já que a necessidade dela parece estar no lugar de um interditado enfrentamento afetivo-familiar para a superação de uma vida determinada.
Propostas para o desbancamento das fetichizações de corpos-mulheres em contextos repressivos e em representações cinematográficas estão sintetizadas na forma-conteúdo de “Femino Plural” (Vera de Figueiredo, 1976), filme que abre o Festival num gesto de homenagem a uma grande e ainda pouco referenciada cineasta brasileira.
A misticidade e a visibilidade positiva de poética dos rituais africanos atravessam o tempo e demais aspectos narrativos de “Faya Day” (2021), documentário ensaístico da mexicana-etíope Jessica Beshir.
Já o documentário brasileiro “Indianara” (Aude Chevalier-Beaumel e Marcelo Barbosa, 2019) mostra, por meio da militância da personagem-título, que o trabalho político combate a alienação, garante direitos e alimenta a vida.
A socialização de mulheres mães-filhas é desnaturalizada pela imaginação fantasiosa e livre de uma garota no filme francês “Pequena Mamãe” (Céline Sciamma, 2021).
E no documentário “Nũhũ Yãg Mũ Yõg Hãm: Essa Terra É Nossa!” (Sueli Maxakali, Isael Maxakali, Carolina Canguçu, Roberto Romero, 2020), a luminosidade intrínseca às imagens em movimento e as possibilidades cinematográficas a partir de olhares e valores indígenas agem em oposição à transparência das relações raciais e culturais ditas cordiais em um país multicultural e multiétnico.
Acerca dos potentes curtas-metragens que integram a programação desta edição, destaca-se o magnetismo emanado pelas imagens e tramas das obras, que são bastante distintas entre si e compõem uma amostra do que de mais provocativo está sendofeito em diferentes lugares do Brasil por cineastas com repertórios múltiplos.
Valorizando as realizadoras e suas persistências em momentos históricos e políticos desafiadores, desejamos a todes um ótimo, provocativo e inspirador festival.
Mariana Queen Nwabasili e Lorenna Montenegro
Curadoras da edição 2022
Mariana Queen Nwabasili é jornalista e pesquisadora, doutoranda e mestra em Meios e Processos Audiovisuais pela ECA-USP. Pesquisa representações e recepções vinculadas a gênero, raça, classe e colonialidade no cinema. Tece análises críticas sobre Teatro e Cinema, tendo sido uma das 10 pessoas selecionadas para participar do Locarno Critics Academy, na Suíça, em 2021. Entre 2020 e 2022, como bolsista do Projeto Paradiso, realizou Máster em Curadoria Cinematográfica na Elías Querejeta Zine Eskola, na Espanha. @mariqueensp
Lorenna Montenegro é crítica de cinema, roteirista, curadora, professora, jornalista cultural e produtora de conteúdo. Integra o Coletivo Elviras e a Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Ministra oficinas, workshops e minicursos sobre filmologia feminista, construção de personagens, crítica, história e estética do cinema/vídeo. Dá aulas na Academia International de Cinema (Filmworks) e Coordena o Festival As Amazonas do Cinema. @lorennmontenegro
Ficha técnica
Realização
Ipê Rosa Produções
Laranjeiras Filmes
Direção Geral e Coordenação de Comunicação
Marília Nogueira
Direção Geral e Produção Executiva
Vânia Matos
Curadoria de Programação
Lorenna Montenegro
Mariana Queen
Em parceria com Cardume Curtas
para a mostra de curtas-metragens
Luciana Damasceno
Kelly Versiani
Produção
Elodie Salmeron
Gabriela Falcão
Gracielly Guedes
Assistente de Comunicação
Karina Souza
Controller
Marina França
Identidade Visual
Myla Lopes Designer
Videografismo | Vinheta
Veruscka Girio | Astronauta Mecanico
Comunicação e redes sociais
Tereza Comunicação
Gabi Baeta – Head de marketing
Letícia Lucinda – Diretora de arte
Júlia Diniz – Diretora de arte
Tati Quintão – Gerente de Relacionamento
Marina Schmidt – Diretora de Criação
INTERCÂMBIOS
Entrevistas
Lorenna Montenegro
Lucia Monteiro
Mariana Queen
Edição de vídeos
Nin Lacroix
Tradução e legendagem
Bruna Sarubo
Cristiana Brindeiro
Laysla Brigatto
Assessoria de Imprensa
Katia Carneiro
Luisa Mattos
Agência Febre
Website
Coordenação técnica dos filmes
CABÍRIA PRÊMIO DE ROTEIRO
JÚRI
Iafa Britz
Raphaela Leite
Sylvia Palma
CURADORIA
Bruna Paixão
Camila Cordeiro Ribeiro
Cecília Amado
Daiana de Souza
Marina Burdman
Silvana Belise
MENTORIAS ABRA 40+
Paula Knudsen
Fernanda Polacow
CABÍRIA LAB
COORDENAÇÃO
Marília Nogueira
Vânia Matos
Consultora de metodologia
Vanessa Fort
Assistente de Coordenação do Prêmio & Lab
Gabriela Falcão
CURADORIA
Longa Ficção
Aline Oliveira
Cecilia da Fonte
Deborah Abreu
Camila Elias
Carollini Assis
Maria Lutterbach
Longa Ficção Infantojuvenil
Érika Ferreira
Gell Macedo
Luciana Damasceno
Tamiris Hilário
Série Ficção
Clara Ferrer
Fernanda Conde
Jéssica Maria Araújo
Maira Cristina
Maria Helena Silva
Raquel Terto
CONSULTORAS
Longa-metragem de Ficção
Glenda Nicácio
Vana Medeiros
Longa Infantojuvenil de Ficção
Renata Sofia
Vanessa Fort
Série de Ficção
Marina Meira
Thays Berbe
CONVIDADAS
Iana Cossoy Paro
PRÊMIO CARDUME -CABÍRIA
JÚRI
Gabriela Falcão
Karina Souza
Marília Nogueira
Vânia Matos
PRÊMIO ROTA-CABÍRIA
JÚRI
Gabriela Falcão
Karina Souza
Marília Nogueira